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Holografia é a tecnologia do futuro, mas não o futuro do 3D


Mal os brasileiros começam a sonhar com seus televisores 3D e já tem gente dizendo que o futuro são as televisões holográficas. Uma tecnologia que dispensa os óculos 3D, que produz imagens em terceira dimensão, mas que ao contrário do 3D, acusada de antinatural por muitos especialistas por forçar os olhos humanos, não prejudicaria a visão. Só que, diferente do que muitos acreditam, a holografia não é uma evolução do 3D. Na verdade, os hologramas foram concebidos teoricamente em 1947 pelo húngaro Dennis Gabor, mas só viraram realidade na década de 60 com a invenção do laser. O 3D, por sua vez, teve início em 1838, com a invenção do estereoscópio pelo britânico Charles Wheatstone, instrumento criado para o exame de pares de fotografias ou de imagens vistas de pontos diferentes que engana a visão humana, dando a ilusão de uma terceira dimensão.

De acordo com o professor do Instituto de Informática da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, PhD em Ciência da Computação, Anderson Maciel, a holografia e o 3D diferenciam-se em sua essência. Ainda que as duas tecnologias sejam capazes de dar origem a imagens em três dimensões, a holografia é, antes de qualquer coisa, uma forma de registrar informação. A tecnologia 3D, assim como o cinema, nasce da fotografia e, através da sobreposição de imagens, cria a ilusão de uma terceira dimensão. “A imagem em 3D é, na verdade, uma fotografia em estéreo. Ela é formada por duas imagens que são fotografadas uma a partir do ponto de vista do olho humano esquerdo, e outra a partir do olho humano direito, que quando fundidas no cérebro e com a ajuda dos óculos 3D parecem estar em três dimensões”, disse ele em entrevista ao Terra. Já o holograma não é uma informação que passa por um ponto, como no caso da fotografia, pela abertura da objetiva, mas uma informação gravada em um chapa que passa por milhares de pontos de luz e que formam uma imagem em três dimensões. “Uma foto comum grava o reflexo da luz, já o holograma grava o padrão de reflexão de luz”, explica ele.

Para Maciel, a “explosão” de uma tecnologia em um momento ou no outro depende do quanto as pessoas estão preparadas para absorvê-la, e se existe conteúdo para essa tecnologia. Foi o que aconteceu com o 3D e ocorre com a holografia, de certa forma. “Parece que o 3D surgiu ontem, mas na verdade meu pai já tinha ido ao cinema ver um filme em 3D quando era criança, só que não pegou naquela época, especialmente porque quase ninguém estava desenvolvendo conteúdo”, disse ele. Em alta desde o início dos anos 2000 e, especialmente depois de Avatar, filme de James Cameron, lançado em 2009, o cinema 3D não é de hoje: ao que tudo indica, a primeira produção em 3D data de 1922 e chama-se The Power of Love.

A holografia e suas aplicações

Ainda de acordo com Maciel, com o desenvolvimento das tecnologias 3D e de toda a especulação sobre a holografia, a palavra holograma está sendo “banalizada”, isto é, utilizada para identificar imagens que não são hologramas, mas apenas projeções. “Para que possamos ter uma televisão verdadeiramente holográfica, a tecnologia tem que evoluir e ficar mais barata. Já existem experimentos com laser e luz branca, mas para produzir conteúdo holográfico, é preciso que exista uma câmera holográfica, por exemplo”, afirmou o pesquisador.

Segundo ele, a holografia não passou por nenhuma evolução tecnológica transformadora nos últimos tempos, mas o laser se tornou mais acessível. A maior parte das tecnologias se desenvolve mais rapidamente se há demanda e se as pessoas podem fazer experimentos. De acordo com Maciel, no que diz respeito à holografia, o que vem sendo feito de novo são lâmpadas, que não são de laser, mas que têm uma maior luminosidade e que tem um comportamento parecido ao do laser, de ser direcional.

Segundo Anderson Maciel, a cantora japonesa Hatsune Miku, por exemplo, que no ano passado ganhou destaque em diversos blogs de tecnologia e também em programas brasileiros de televisão não é um holograma, e sim uma projeção. A tela que projeta a artista virtual “é provavelmente um vidro com uma película transparente e com partículas refletivas colocado no meio do palco. Como a projeção usa um fundo preto e apenas a personagem tem luz, a tela quase não aparece”. A voz da cantora foi criada a partir do Vocaloid, um software sintetizador de voz da Yamaha Corporation que permite que o usuário faça canções apenas digitando a letra e melodia. Em cima disso, foi feita uma animação sincronizada com a voz na opinião de Maciel.

O mesmo, de acordo com o especialista, acontece com os hologramas de funcionários do aeroporto de Manchester, no Reino Unido. As gravações de John Walsh e Julie Capper que aparecem para os passageiros explicando as restrições de segurança são projetadas em uma tela recortada na forma do corpo de cada um, não tem sequer três dimensões.

As aplicações atuais mais comuns da holografia, na realidade, não são em efeitos visuais, mas de segurança, pois é difícil de reproduzir em um equipamento. Exemplos de hologramas de verdade, de acordo com Maciel, são os selos dos cartões de crédito e aquela fita na nota de 20 reais: “ao invés de usar laser a fita usa a luz normal, e não precisa de uma fonte de luz porque usa o alumínio, que é um espelho que reflete a luz. A luz vem lá de trás, passa pelo filme do holograma e as pessoas vêem a imagem do mico ou do ’20’ como se ela estivesse fora”, explica o professor. O foco automático das câmeras digitais também usa princípios da holografia, assim com os leitores de códigos de barra dos produtos nos supermercados.

O futuro do armazenamento de dados, esse sim, passa pela holografia. Já existe, apesar de não ser comercializado, o Holographic Versatile Disc, o HVD (em português, o Disco Holográfico Versátil), um disco como um CD que pode armazenar de 330 GB (gigabytes) até 3,9 TB (terabytes). Para se ter uma ideia, um DVD armazena 4,7GB, um HD DVD tem espaço para 15 GB e um Blu-Ray armazena 25 GB. O sistema HVD utiliza dois feixes ópticos para criar os dados tridimensionalmente. Alinhar estes feixes em um custo comercial viável foi o primeiro desafio dos cientistas, que em seguida tiveram que encontrar um equilíbrio entre a alta tensão utilizada nos lasers e um material compatível para o disco. O HVD, ao invés de gravar as informações em uma camada muito fina do disco, aproveita quase toda a sua espessura.

O futuro é holograma?

O futuro da holografia passa pelo desenvolvimento da própria tecnologia, pela produção de conteúdos próprios para tal, mas também pela evolução de outras tecnologias. Na opinião de Maciel, o fato de existir determinada tecnologia não significa que ela vá fazer parte do dia-a-dia das pessoas. Como bem lembrou o pesquisador, hoje já é possível fazer vídeochamadas através do smartphone, mas pouca gente faz. Pensar num celular que crie hologramas das pessoas enquanto elas falam é possível, de acordo com Maciel, mas é preciso que a banda de rede consiga transmitir tantos dados, e a que temos hoje certamente não suportaria. Além disso, é necessário que exista uma luz forte o suficiente para projetar o holograma e uma bateria de smartphone que dê conta. “Com a evolução do Laser de LED, que hoje custa cinquenta centavos, mas já custou milhões, é possível que tenhamos uma vídeochamada holográfica, e pode não demorar muito”, afirmou o professor.

Uma televisão com holograma que, especula a BBC Brasil, é a nova fronteira do 3D e poderá ser lançada já no final do ano que vem, não é o que se pode chamar de uma televisão holográfica. Seria, de acordo com Maciel, mais uma TV estereoscópica que não requer óculos especiais. Uma televisão holográfica, segundo Maciel, não teria sequer o formato de uma TV como as conhecemos. Uma televisão holográfica provavelmente teria de ser um objeto na horizontal que projeta uma imagem holográfica, o que mudaria completamente a forma de fazer conteúdo, um filme, por exemplo. Hoje, para fazer um filme 3D, precisa-se uma câmera estereoscópica que filme um mesmo objeto de uma distância compatível com a distância entre os olhos humanos e crie a ilusão da terceira dimensão. Para fazer um filme holográfico, seria necessário mais de um ponto de vista, seria preciso vários pontos de vista para filmar um mesmo objeto de todos os ângulos para que fosse possível o usuário vê-lo pelo ângulo que desejasse. “A gente pode pensar numa imagem holográfica formada a partir de três tomadas estéreo – como no cinema 3D de hoje -, em que uma cena é fotografada de três posições equidistantes em torno dela e que a minha TV do futuro, ao invés de ter uma tela, gera um volume de imagem sobre a mesa que eu possa ver de todos os ângulos ao redor dela, e de cada ângulo tenho uma vista diferente”, explicou Maciel.

O futuro dos hologramas, segundo Anderson Maciel, é o espaço, e não uma imagem projetada em uma tela. O Japão, ao que tudo indica, pode criar hologramas de fato na copa de 2022. De acordo com o Gizmodo, os japoneses querem instalar sistemas de transmissão holográfica por estádios em todo o mundo para aqueles que não puderem ir ao Japão. Com uma exibição holográfica dentro de estádios vazios, os jogos poderiam ser acompanhados de vários cantos do mundo, só não se sabe se seria em tempo real.

Na opinião do professor Anderson Maciel, entretanto, o futuro mesmo é substituir essas tecnologias como o 3D e a holografia por outras que pulem a etapa de percepção do sistema visual humano. “O passo seguinte é conectar eletrodos no sistema nervoso para estimular direto o córtex visual, a parte do cérebro em que é formada a imagem, captá-la sem precisar passar pelo olho humano. A partir daí, poderemos não mais distinguir o mundo real do virtual”. É esperar para ver. Mas não como vemos atualmente.

Com informações de Terra Com informações do Baixaki e da BBC Brasil.