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iPod entra para currículo escolar nos EUA

Uma proibição contra o uso de iPods foi imposta com tanta rigidez na escola de ensino médio José Martí, nos EUA, que chega a três o número de aparelhos confiscados dos alunos por semana. Eles só são devolvidos diretamente aos pais dos estudantes.

No entanto, apesar de os alunos receberem ordem de deixar o iPod em casa, a escola de Hudson County está distribuindo os tocadores digitais portáteis para ajudar alunos estrangeiros, com conhecimentos apenas básicos de inglês, a aprimorar o vocabulário e a gramática cantando músicas pop.

No mês que vem, o distrito da cidade de Union distribuirá 300 iPods às escolas locais como parte de um projeto de US$ 130 mil em um dos sistemas escolares urbanos mais carentes de New Jersey. O programa incentivou diversos outros distritos, como os de Perth Amboy e South Brunswick, a implementarem seus próprios programas de iPod no ano passado. O projeto chamou a atenção de educadores do condado de Westchester a Monrovia, na Califórnia.

A disseminação dos iPods nas salas de aula ocorre justamente quando muitas escolas do país proibiram os tocadores digitais nas dependências da escola, além de celulares e aparelhos de DVD, pois representam uma distração, ou às vezes coisas mais sérias. Houve casos de alunos flagrados colando em provas depois de carregarem respostas, fórmulas matemáticas e anotações nos iPods.

Entretanto, algumas escolas estão reavaliando a proibição do iPod, na tentativa de adotar o aparelho para fins educacionais. No mês passado, as escolas de Perth Amboy adquiriram 40 iPods para os alunos usarem em aulas bilíngües que seguem o modelo das escolas de Union City. Em South Brunswick, 20 iPods foram usados há alguns meses nas aulas de francês e espanhol. E em North Plainfield, em New Jersey, a escola distribuiu iPods para professores de ciências para ilustrarem os conceitos de química, e está pensando em permitir que os alunos dessas aulas usem os próprios iPods que trouxerem de casa.

Inovação
“É uma inovação”, diz Frank Belluscio, porta-voz da Associação das Escolas de New Jersey, que selecionou educadores de Union City para falar sobre as aulas com o iPod na conferência anual do grupo em Atlantic City, de 24 a 26 de outubro. “A maioria das pessoas pensa no iPod apenas como entretenimento”.

Na escola José Martí, os iPods prateados, com telas de vídeo embutidas, que custam cerca de US$ 250 a unidade, são distribuídos no início da aula com fones e dicionários espanhol-inglês. Os iPods são recolhidos ao término da aula e, segundo representantes da escola, até hoje nenhum sumiu nem foi quebrado.

Em uma das aulas, os alunos da oitava série acompanhavam as letras do rock “Hey There Delilah”, da banda Plain White T’s, enquanto a música tocava nos iPods repetidas vezes. Os mais corajosos cantavam alto.

“Ele (o iPod) conversa comigo”, disse Stephanie Rojas, 13, que se mudou para os EUA no ano passado vindo de Porto Rico e que agora prefere cantar em inglês. “Fico um tempão no banho porque gosto de cantar e meus irmãos ficam gritando para eu sair logo”.

Pedro Noguera, professor de sociologia da New York University que estuda escolas em zonas urbanas, contou que um número maior de escolas está usando novas tecnologias como iPods para envolver os alunos. Por exemplo, diz ele, alguns professores criaram videogames com temas das aulas de história e também pediram que os alunos encenassem romances e peças no YouTube.

“Sabemos que a principal reclamação sobre a escola é que ela é um tédio porque o modelo tradicional ensinado se baseia na aprendizagem passiva”, explicou Noguera. “Não é interativa o suficiente”.

Equipados
Em muitas comunidades ricas, os iPods se tornaram um acessório essencial dos alunos. Em 2004, a Duke University inovou equipando sua turma inteira de calouros com iPods que estavam pré-configurados com orientações e até com o grito de guerra da Duke. Embora a Duke não distribua mais iPods, ela mantém uma série de aparelhos que são emprestados aos alunos para assistirem as aulas. No último semestre, 93 dos cerca de 2.000 cursos da Duke exigiam o uso de iPods.

A Brearley School, escola particular para meninas no Upper East Side em Manhattan, usou os iPods para complementar os livros de idiomas estrangeiros e as aulas de música, teatro e inglês. Toda aluna da Brearley, da sétima série ao ensino médio, é obrigada a comprar ou alugar um iPod.

Em Union City, os iPods são considerados um luxo por muitas das famílias de imigrantes que moram neste centro urbano extremamente populoso, conhecido no passado pelas fábricas de bordados. Cerca de 94% dos 11 mil alunos do bairro se enquadram nos requisitos que os qualificam para receber merenda gratuita ou mais barata.

O distrito de Union City, que conta com um orçamento anual de US$ 197 milhões, prioriza as aulas bilíngües já que mais de um quarto de seus alunos está aprendendo o básico do inglês. Representantes do distrito dizem que o desafio é difícil: quatro das 12 escolas do distrito foram identificadas como necessitando de melhorias, de acordo com a lei federal No Child Left Behind (Nenhuma criança fora da escola), em grande parte porque um número insuficiente de alunos bilíngües passou nos exames de leitura e matemática do estado.

Bilíngües
Grace Poli, especialista em mídia da José Martí, disse que em 2004 contatou representantes do distrito para cogitar a compra de 23 iPods para um programa bilíngüe após o horário normal de aula, depois de se surpreender com a paixão dos alunos pelos aparelhos. Os alunos, cujo espanhol era a língua materna, pareciam entediados com os livros didáticos em inglês, disse ela, os quais consideravam obsoletos e irrelevantes.

O programa ficou tão popular que foi inserido no currículo regular da escola no ano seguinte e, em 2006, Poli recebeu mais 60 iPods. Em maio deste ano, o distrito decidiu comprar 300 iPods para expandir o programa para outras escolas neste semestre.

Poli procurou nas paradas musicais as canções mais populares entre os alunos, compilando uma eclética seleção de Shania Twain, Barry White, U2 e Black Eyed Peas. Ela baixou as músicas nos iPods e digitou as letras. Em seguida, apagou todos os substantivos, e em seguida os verbos e adjetivos, obrigando os alunos a preencher os espaços em branco e aprender o significado das palavras que faltavam.

Em aula, eles cantam ou lêem em voz alta as letras completas que preencheram.
“Muitos de nossos alunos bilíngües são extremamente tímidos e se sentem deslocados”, disse Poli, cujos pais imigraram do Equador. “Temos crianças que nunca haviam falado sequer uma palavra em inglês e agora cantam Black Eyed Peas. Foi um trabalho difícil, mas valeu a pena”.

Poli também baixou áudio-livros, inclusive a série Harry Potter, e adicionou dispositivos de gravação aos iPods para que os alunos pudessem escutar a própria pronúncia enquanto lessem poesia ou conversassem com os colegas.

Embora os iPods sejam usados sobretudo nas aulas bilíngües, o distrito planeja experimentá-los com alunos com dificuldade de aprendizagem e problemas comportamentais como parte da expansão do programa, previsto para começar no próximo mês. No ano passado, Poli colaborou com uma aula alternativa de educação criando podcasts com dicas para a hora de fazer provas que foram compartilhadas com a escola inteira.

Poli contou que seus alunos falantes de espanhol, conhecidos na escola como o Pessoal do Pod, conseguiram deixar as aulas bilíngües depois de apenas um ano usando os aparelhos digitais, comparados com a média de quatro a seis anos da maioria dos alunos que freqüentam essas aulas.

Geri Perez, diretora da José Martí, contou que os pais haviam pedido que seus filhos fossem matriculados nas aulas equipadas com iPod. Perez, que não fala espanhol, disse que os alunos das aulas bilíngües que antes fugiam dela para não ter que conversar em inglês ganharam autoconfiança e agora se aproximam dela nos corredores. Dianelis Cano, 13, que se mudou para os EUA vindo de Cuba há menos de dois anos, disse que aprendeu tanto inglês que a mãe, vendedora de roupas, comprou um iPod para ela como prêmio pelas boas notas. Dianelis carrega suas próprias músicas no iPod para praticar inglês, embora também inclua músicas em espanhol.

“Vou checar seu iPod para ter certeza de que aí tem músicas em inglês”, Poli brincou com a aluna. “Vou fazer visitas à sua casa”.

Com informações de G1.